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Deficiência física não impede gestação saudável, reforça Santa Casa

No Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência, mulheres com deficiências diversas superam preconceito e inacessibilidade para se tornar mães

Mulheres com deficiência física podem engravidar sem risco ou complicações, indicam especialistas multiprofissionais da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará (FSCMP), maior maternidade da região norte do Brasil. O reforço serve como uma conscientização inerente a esta terça-feira, 21 de setembro, Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência.

 Existente há 371 anos, a Santa Casa realiza, em média, 700 partos por mês.

“A rigor, as deficiências físicas clássicas não são obstáculo para uma gravidez tranquila e saudável. É tudo uma questão de adaptação do pré-natal, do parto e do puerpério às necessidades especiais de cada gestante”, considera o obstetra Vinícius Moraes.

O médico explica que, assim como em qualquer evento de gravidez, independentemente de a mulher apresentar alguma limitação corporal temporária ou definitiva, o ideal é se preparar com check-up prévio, como consulta antenatal e avaliação ginecológica: “Quanto mais controlarmos o risco de comorbidades, como hipertensão e diabetes, melhor será a performance de todo o processo de gestar”, pontua.

Para pacientes com dificuldades motoras, por exemplo, como paraplegia, é válido um acompanhamento com fisioterapeuta, no sentido de estímulo muscular e melhora de funcionalidade, a fim de se propiciar mais conforto e segurança durante o trabalho de parto e de se diminuir o perigo de intercorrências no pós-parto.

Humanização

Ainda, não é regra que a gestantes com deficiência só exista a opção de cesariana: “Esse resultado depende de vários fatores, inclusive do grau e da categoria da própria deficiência, e a conduta clínica não é impositiva: avaliamos a circunstância e oferecemos o método de maior segurança para a mãe e o bebê”, considera o obstetra.

Moraes destaca a relevância do protocolo de humanização na rotina hospitalar: “Todas as pacientes têm direito a um atendimento acolhedor, com suporte psicológico e ambiente acolhedor. No caso das parturientes, adotamos medidas como contato pele a pele dos pais com o recém-nascido e aleitamento imediato – e esse contexto pode ter um peso maior ainda para famílias vulnerabilizadas pela experiência histórica de capacitismo”, comenta.

Um Sonho Realizado

Moradora do bairro da Pedreira, em Belém, Jennifer Linder Sousa, 26, perdeu totalmente a audição aos 11 meses, por causa de uma meningite bacteriana, contraída durante um surto no interior de Abaetetuba, nordeste do Pará.

Naquele ano, 1995, a mãe de Jennifer, a microempresária Ana Rita Sousa, 50, chegou à Santa Casa em desespero, porque a criança parara de andar e de ensaiar palavras.

“Assim que ela teve sintoma, fui atrás de ajuda, mas demoraram pra diagnosticar. Só quando chegamos à Santa Casa foi que descobriram a meningite e começaram a tratar. Conseguiram reverter as outras sequelas, mas a surdez ficou”, relembra Ana Rita.

Jennifer estudou em escolas direcionadas, entretanto, devido a se sentir “diferente”, acabou suspendendo o sonho de cursar faculdade de Fisioterapia. Por ora, ela aproveita a realização de outro sonho: a maternidade. Cecília nasceu há um ano e meio, também na Santa Casa, de parto normal. O marido de Jennifer e pai de Cecília, o auxiliar de serviços gerais Lucas, 25,  igualmente é deficiente auditivo absoluto.

Para lidar com exigências típicas dos cuidados com a bebê, como a identificação de choro, a ajuda dos avós maternos é fundamental. A tia materna, Joyce Priscila, 28, autônoma, completa a rede de apoio. A não ser Lucas, todos moram na mesma casa.

“Amo minha menina. Cuido muito da minha filha. E o meu parto na Santa Casa foi muito bom. Eu fui muito bem atendida e não tive medo”, exclama.

Rede de Apoio

De acordo com Jureuda Guerra, psicóloga da Santa Casa e presidente do Conselho Regional de Psicologia (CRP), a integralidade do Sistema Único de Saúde (SUS) caminha para uma prática cada vez mais inclusiva: “Nenhuma gestante é igual. A situação de deficiência faz parte da diversidade social e não pode surpreender as equipes e as estruturas: trabalhamos para corresponder àquilo de que cada paciente precisa, para prover o bom acompanhamento sistêmico e multidisciplinar”, analisa.

Jureuda Guerra relata que os desafios cotidianos servem de experiência e sensibilização: cita casos de gestantes com nanismo que demandaram adequação da altura e do tamanho do mobiliário de salas de pré-parto e centro cirúrgico e de gestantes cegas as quais se emocionaram com a descrição falada do passo a passo do nascimento dos seus bebês : “Vamos gerenciando as histórias e entendendo de que modo acomodar a estrutura geral do Hospital às individualidades”, acrescenta.

Segundo a especialista, é inevitável que tais gestantes sofram a influência do que cabe ser chamado de “olhares estranhos” – e é a rede de apoio hospitalar, familiar e comunitária que colabora para que essas novas mães sejam respeitadas em sua autonomia e em seu afeto, com estratégias de fortalecimento da autoestima e contexto de políticas públicas sociais.

“É dever coletivo, até dos sistemas de saúde, que tais estigmas sejam desconstruídos, porque o julgamento social, de que essa mãe não deveria engravidar, de que essa mãe não é capaz de cuidar e de educar filhos, só se respalda no preconceito e na ignorância, não faz sentido científico”, afirma, salientando que “diferentes mulheres podem exercer a maternidade”, coloca.

 
Texto: Aline Miranda
 
Fotos: Acervo Pessoal e Rafaela Soeiro 

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